Não são raros os depoimentos de brasileiros que só se reconheceram latino-americanos quando estavam vivendo na Europa. A “ideia” de América Latina é fruto da “invenção” ideológica de colonizadores e exploradores europeus, no século XIX, sobretudo pela França napoleônica, interessada em demarcar sua área de influência na América (latina), e pelo novo país americano, os Estados Unidos da América, que logo estabeleceu como legítimo no seu “destino manifesto” dominar os demais povos (“inferiores”) ao sul do rio Bravo, chamados latinos. O “destino manifesto” (“A pura raça anglo-americana está destinada a estender-se por todo o mundo com a força de um tufão. A raça hispano-mourisca será abatida”) logo mostrou a sua verdadeira face, quando os Estados Unidos, já tendo anexado o Texas em 1836, entraram em guerra contra o México (1846-48), usurpando metade do território do vizinho.
Partindo da “ideia” de América Latina, muitos de nossos intelectuais e líderes políticos deram ao conceito um caráter positivo. Simon Bolívar jurou, na Itália, lutar pela independência das colônias americanas a fim de criar a república da “Gran Colômbia”, que reuniria em seu território o que hoje pertence a vários países da América do Sul. José Martí, poeta e líder político cubano, pensou a “nuestra América” independente das potências européias decadentes, mas, também, livre do jugo imperialista da potência nascente do grande irmão do Norte. José Carlos Mariátegui, jornalista e militante político peruano, defendeu a Indo-América livre da dominação capitalista. Ernesto “Che” Guevara, argentino de nascimento, entregou a sua vida pela causa dos povos explorados da América Latina. Com passagem pela Guatemala, México e Cuba, onde participou da guerrilha que realizou a revolução de 1 de janeiro de 1959, “Che” foi dirigente do estado socialista cubano até entregar seus cargos e condecorações para embrenhar-se em uma nova guerrilha na selva boliviana, onde foi covardemente assassinado, em outubro de 1967, após ter sido ferido e encontrar-se preso.
Em livro recentemente publicado (Latino-americanos à procura de um lugar neste século. SP, Iluminuras, 2008.), o antropólogo argentino, radicado no México, Néstor Canclini, nos pergunta: quem somos nós, os latino-americanos? Esta resposta, creio, embora já tenha uma longa história, como vimos acima, está em construção e dela participam intelectuais, artistas, políticos e todos povos dos países ao sul do rio Bravo. Nós, do curso de Comunicação Social da Faculdade 2 de Julho, estamos dando nossa contribuição nesta discussão e na busca desta resposta. O III POLICOM (Congresso de Comunicação Social e Políticas Culturais) dedica-se ao documentário na América Latina, tendo como tema central: “Cartografia do documentário na América Latina”. O Cineclube Cine em Debate, acompanhando este esforço, vai na mesma direção e faz deste semestre um período dedicado à exibição e discussão do documentário na América Latina. Para isto, fomos buscar, em alguns dos principais países produtores, obras de excelência que enriquecem a produção do cinema documentário no mundo, bem como ampliam a esfera de nossa formação cultural.